O contrato de transporte aéreo se trata de obrigação de resultado já que o transportador se obriga a um objetivo certo, transportar o passageiro até o destino final, em horários de saída e chegada pré-determinados.
O atraso ou cancelamento de um voo, seja por problemas técnicos, seja pelo mal tempo, caracteriza fortuito interno que não exclui a responsabilidade do fornecedor visto que está diretamente relacionado à natureza da atividade econômica exercida e, portanto, submetida aos riscos do empreendimento.
A ANAC, por meio de sua Resolução nº 400/2016 determina que a companhia aérea, diante de atrasos e cancelamento de voos, deve fornecer aos seus consumidores auxílio material, desde acomodações, alimentação e serviço de hospedagem.
Em caso de atraso superior a duas horas, o transportador deverá oferecer alimentação ao passageiro.
Caso o atraso seja superior a quatro horas, o transportador deverá oferecer serviço de hospedagem para o passageiro que não residir na cidade do aeroporto onde ocorreu o atraso, bem como transporte de ida e volta para o aeroporto.
Além disso, o passageiro poderá ajuizar uma ação indenizatória por danos morais e materiais caso tenha sido prejudicado pelas alterações no seu voo, como por exemplo a perda de uma entrevista de emprego ou outro evento importante; perda do transfer ou da diária de hotel.
Para isso, é importante que o passageiro guarde toda a documentação capaz de comprovar o ocorrido e requerer à companhia aérea uma declaração escrita explicando os motivos pelo atraso ou cancelamento.
A jurisprudência nacional entende que atraso ou cancelamento de voo configura falha na prestação de serviço que atrai a responsabilidade objetiva, devendo a companhia aérea responder independentemente de culpa.
Além disso, o atraso ou cancelamento de voo por fortuito interno conduz ao reconhecimento de dano moral presumido.
“Apelação. Relação de consumo. Responsabilidade civil objetiva. Ação de indenização. Contrato de transporte aéreo de passageiro. Atraso em voo doméstico. Cancelamento e atraso de voo. Fortuito interno. Falha na prestação de serviço. Dano moral "in re ipsa". Conquanto reconhecidas na sentença, a falha na prestação dos serviços, assim como o defeito mecânico da aeronave, impedindo a execução do voo no horário ajustado, isso constituindo fortuito interno, o pedido foi julgado improcedente. Apelo dos autores. Assiste-lhes razão. Evidente a relação de consumo subsumindo-se às normas. Lei nº 8.078/90 que, em seu art.14, prevê que o fornecedor de serviços reponde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e risco. A empresa de transporte aéreo responde pela reparação dos danos causados por defeitos relativos à prestação de seus serviços, independentemente da existência de culpa. Releva destacar a responsabilidade do transportador pelos danos causados às pessoas transportadas, conforme previsto no art. 734 do Código Civil. Restou configurada dita responsabilidade e, portanto, o cabimento da pretendida indenização pelos danos morais, assim impondo-se a sua reparação integral, a teor do art. 6º, incisos III e VI e art. 22 do Código de Defesa do Consumidor. Ou seja, a responsabilidade civil independente da prova de culpa na conduta do fornecedor de serviços, admitindo a exclusão da responsabilidade apenas quando o fornecedor provar que o defeito inexiste ou quando o dano decorre de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, caput, e §3° do CDC). Tem-se que não se trata de um mero atraso por eventual fortuito externo ou interno. Tampouco de atraso inferior a 4 (quatro) horas, como previsto no art. 21, inciso I da Resolução 400/2020 da Agência Nacional de Aviação Civil - ANAC. A ré, comprovadamente, se limitou a fornecer aos apelantes os vouchers de fls. 112: duas refeições nos valores de R$74,00 e R$66,00. Depois de um atraso de quase 10 horas, decorrente de falha técnica da aeronave, o que caracteriza fortuito interno, ou seja, risco esperado da atividade desenvolvida, a apelada forneceu aos consumidores apenas vouchers para as apontadas refeições. Não há dúvidas, quanto a que a falha no serviço aéreo, conduz ao reconhecimento do dano moral, no caso, "in re ipsa". Restou configurado o dano moral, na medida em que caracterizada a ocorrência de fortuito interno, inscrito à álea comercial de exploração do ramo de aviação, consoante a teoria do risco do empreendimento, na qual o fornecedor deve assumir os reveses que sejam relacionados à atividade que desempenha, dentre os quais, como visto, os atrasos superiores a quatro horas, o que deve resultar na indenização. De fato, até esse período, considera-se razoável a espera, conforme o parâmetro que estipula a ANAC (art. 3º da Resolução ANAC 141/2010), valendo destacar a incontornável necessidade de informação completa ao passageiro, seguida de sua anuência. Ré que, ademais, não se desincumbiu a contento do seu ônus probatório (art. 373, inciso II do CPC). Impositiva a reforma integral da sentença hostilizada, julgando-se procedente o pedido para condenar a empresa aérea ré a indenizar os autores pelos danos morais por eles suportado, no valor de R$2.500,00, para cada autor, a título de danos morais, com juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, nos termos do art. 405 do Código Civil, e correção monetária a partir desta data, conforme o verbete sumular nº 362 do Superior Tribunal de Justiça, assim como ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre a condenação. Recurso a que se dá provimento.” (0008110-69.2018.8.19.0028 - APELAÇÃO. Des(a). MARIO ASSIS GONÇALVES - Julgamento: 07/12/2022 - VIGÉSIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL)
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“APELAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR. ATRASO EM VOO INTERNACIONAL. AUSÊNCIA DE ASSISTÊNCIA POR PARTE DA COMPANHIA AÉREA. BAGAGENS RETIDAS. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM ARBITRADO QUE NÃO ATENDE AOS PRINCÍPIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MAJORAÇÃO. Pretendem os autores a majoração do valor arbitrado a título de indenização por danos morais. Como cediço, o dano moral deve ser este fixado de acordo com o bom senso e o prudente arbítrio do julgador, sob pena de se tornar injusto e insuportável para o causador do dano. Temos, desta forma, que inexistindo padrões pré-fixados para a quantificação do dano moral, ao julgador caberá a difícil tarefa de valorar cada caso concreto, atentando para o princípio da razoabilidade, para o seu bom senso e para a justa medida das coisas. Deve ser levado em conta, além do caráter compensatório do instituto, o seu viés preventivo, punitivo e pedagógico, de modo a coibir reincidências. O julgador, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, deve encontrar um ponto de equilíbrio, de modo que a indenização não venha a corresponder enriquecimento sem causa, nem frustre seu fim maior de reparar integralmente o dano sofrido. In casu, os autores buscam indenização decorrente da falha de prestação de serviços da ré ao descumprir o horário do voo Orlando/Rio de Janeiro, com conexão em Atlanta, que estaria previsto para chegar ao Brasil às 06:35 horas do dia 02/08/2010. Restou demonstrado que, em decorrência do atraso, os autores perderam a conexão em Atlanta, deixando a empresa ré de prestar qualquer assistência aos autores, que pernoitaram no chão do aeroporto, agravando o estado de saúde da 3ª autora, menor, que estaria febril. O segundo autor somente conseguiu embarcar no dia 04/08/2010, e os demais em 05/08/2010, devendo ser acrescentado ainda, que durante o período as malas dos autores ficaram retidas junto à companhia aérea. Consideradas todas essas peculiaridades, entendo que o valor arbitrado pelo Juízo de origem não compensa, de maneira satisfatória, os danos extrapatrimoniais experimentados pelos autores. É que não se pode apenas considerar a falha da prestação de serviços proveniente do atraso do voo, mas também da desídia da ré em prestar o auxílio necessário à família. Destarte, considerando (i) o tempo de atraso (dois dias para o segundo autor e três para os demais), (ii) a ausência de assistência material por parte da ré, e ainda, (iii) as intercorrências quanto à bagagem dos autores, entendo que deve ser provido o recurso para majorar a indenização para R$ 15.000,00, para cada autor, quantia que mais se coaduna com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Provimento do recurso.” (Apelação nº 0021445-39.2014.8.19.0209, Des. Rel. Renata Machado Cotta, 3ª CC, TJRJ, j. em 25/07/2018)
Deve ainda ser aplicada a teoria do desvio produtivo do tempo desperdiçado quando o consumidor permanecer horas na tentativa de resolver o problema, em prejuízo do seu tempo de descanso, lazer ou trabalho.
De acordo com o professor Marcos Dessaune, a teoria do desvio produtivo do consumidor consiste em: “todo tempo desperdiçado pelo consumidor para a solução de problemas gerados por maus fornecedores constitui dano indenizável.”.
Caso seu voo tenha sido cancelado ou atrasado não deixe de reclamar e buscar seus direitos.
Em caso de dúvidas, busque a orientação de um advogado.
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